segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Para os que não entendem os Calvinistas

Uma querida e perplexa irmã comentou "a minha maior dificuldade com o calvinismo é entender por que eles não fazem nada, não se privam de nada, e criticam todos aqueles que estão 'correndo atrás' da salvação por crerem que tal é tomada por esforço. Bem, entendo melhor o calvinismo, mas me sinto mal, pois sempre acho que fiz pouco...". O que mais poderia responder a ela, além do que se segue?

A sua dificuldade, amada, não é com o calvinismo, mas com a graça. Sua rejeição ao calvinismo se deve à sua rejeição à graça como o modo de Deus salvar pecadores perdidos. Se você entendesse e aceitasse a doutrina da graça, como ensinada nas Escrituras, as dificuldades com o calvinismo se evaporariam.

Veja bem, você (permita-me a intimidade) disse que não entende por que os calvinistas não fazem nada, nem se privam de nada para obterem à salvação. À luz da graça, há duas razões para isso. A primeira, é que é desnecessário. Tudo o que era preciso ser feito para nos salvar, Deus já o fez. Uma vida de perfeita obediência era necessária? Jesus a viveu por nós. Uma morte que apresentasse pela satisfação à justiça de Deus precisava acontecer? Jesus a morreu por nós. Uma ressurreição vitoriosa que assegurasse nossa própria ressurreição era preciso? Jesus levantou-se dentre os mortos - e nós com Ele.

O segundo motivo por que os calvinistas desistiram de qualquer esforço para granjear a salvação (pois na verdade, muitos deles se esforçaram à exaustão antes de entregarem os pontos) é que todo esforço é inútil. Ninguém consegue obter o favor de Deus impressionando-o com boas obras, com ascetismo, legalismo ou qualquer outra coisa feita a título de "correr atrás". O evangelho diz "não depende de quem corre, mas de Deus usar misericórdia".

Anulado todo esforço humano, só resta a graça, de modo que se alguém não for salvo absolutamente de graça, não o será de nenhuma outra forma. E graça e esforço próprio são auto-excludentes. Paulo diz que "àquele que faz qualquer obra não lhe é imputado o galardão segundo a graça, mas segundo a dívida". Ou seja, você pode "correr atrás" e ser salvo pela graça ao mesmo tempo. É uma coisa ou outra, mas só uma delas funciona.

Então é perfeitamente compreensível que você "corra tanto atrás", "se prive" de tantas coisas, "se esforce" ao máximo e mesmo assim "se sinta mal" por fazer tão pouco. Pois nunca será o bastante. Você jamais conseguirá reunir crédito suficiente para dar uma espiadela no céu, muito menos para por um pé lá. Ou você se deixa levar pela graça de Deus, desistindo de seu esforço próprio, ou este esforço te arremeterá com mais força no inferno.

Não confunda, porém, graça com libertinagem. "Pecaremos para que a graça abunde?", perguntaram ao apóstolo da graça. Sua resposta é um grito "de jeito nenhum! nós que estamos mortos para o pecado, como viveremos ainda nele?". As obras do crente, são obras de gratidão. Não para alcançar a salvação, mas por te-la alcançado. Não por medo de perde-la, mas por amor ao que a garante. Não para evitar o inferno, mas porque estamos a caminho do céu.

Que o Senhor possa levá-la a descansar na Sua graça!

Soli Deo Gloria

Clóvis Gonçalves é blogueiro do Cinco Solas e escreve no 5 Calvinistas às segundas-feiras.

domingo, 18 de julho de 2010

Soberania e Responsabilidade Humana

Quando me coloco a pensar , orar e muitas vezes perder o sono com as questões da Fé , me achego a um ponto onde a mente racional não traz nenhum entendimento diante do Paradoxo da Salvação . Por vezes abraço o Calvinismo , exaltando a Soberania de Nosso Senhor que Elege e predestina , em outras me sinto arminiano , me preocupando em relação a responsabilidade humana e até mesmo buscando uma defesa ao Projeto Eterno que não é fatalista mas é perfeito .
A Bíblia sustenta igualmente a soberania de Deus e a liberdade humana. Como vimos nos posts anteriores, há textos que falam sobre os decretos de Deus, sobre a predestinação e sobre o absoluto controle que Deus exerce sobre o mundo e sobre suas criaturas por meio da providência, mas também há textos que falam que o ser humano é livre para fazer suas próprias escolhas, que não é coagido a nada, e que é o único responsável por suas atitudes. Quem lê só os primeiros textos, diz que seu Deus sabe todas as coisas, nunca é surpreendido por coisa alguma, nunca muda de opinião e mantém tudo sob seu mais estrito e absoluto controle, e, às vezes, por isso, essa pessoa assume uma concepção teológica que poderia ser chamada de hipercalvinismo. Quem lê apenas os últimos textos percebe que, às vezes, esse Deus parece se arrepender, mudar de opinião, agir de um modo que ele próprio havia dito que não agiria e parece um tanto quanto surpreendido com atitudes do ser humano. Então, essa pessoa advoga uma posição conhecida como arminianismo. Quem está com a razão? Qual teologia está mais correta? Qual é a melhor “descrição de Deus”? As duas se baseiam em textos bíblicos, mas apenas nos textos que sustentam sua própria visão. Ambas estão erradas justamente porque querem forçar um padrão que simplesmente não há no texto bíblico. Ambas querem eliminar as exceções e fixar um modo estrito de Deus agir. Isso é iluminismo, a filosofia que desejava enquadrar todas as coisas dentro de uma concepção estática da realidade e, justamente por isso, excluiu o próprio Cristianismo de "seu mundo", o mundo da ciência.

O curioso é que a Bíblia narra que, ao mesmo tempo, Deus é soberano e o homem é livre e responsável, e faz isso num mesmo texto, e várias vezes, sem tentar harmonizar ou dar maiores explicações como já vimos anteriormente no primeiro post desta série (Veja Fp 2.12-13; Lc 22.22; At 2.22-23).

A Confissão de Fé de Westminster captou isso perfeitamente. Uma leitura atenta do texto da confissão mostra que algumas palavras frequentemente aparecem. São elas: “mas”, “porém”, “contudo”, “todavia”, etc. Essas palavras são conjunções adversativas. É preciso perguntar: Por que há tantas conjunções adversativas na Confissão de Fé? A resposta é que os teólogos puritanos de Westminster não quiseram eliminar o paradoxo. Veja um dos textos mais conhecidos da confissão:

“Desde toda a eternidade, Deus, pelo muito sábio e santo conselho da sua própria vontade, ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece, porém de modo que nem Deus é o autor do pecado, nem violentada é a vontade da criatura, nem é tirada a liberdade ou contingência das causas secundárias, antes estabelecidas” (III,1).

É impressionante como os teólogos de Westminster entenderam o paradoxo bíblico e não o quiseram eliminar. Isso prova que eles não foram racionalistas. Um racionalista nunca poderia sustentar as duas afirmações acima ligadas pela palavra “porém”. Um racionalista só poderia dizer que, ou Deus decretou tudo, ou o homem é livre. Mas os teólogos de Westminster não estavam presos aos padrões da lógica racionalista, eles estavam presos aos padrões das Escrituras. Justamente porque as Escrituras sustentam esse paradoxo de forma tão claro, eles também sustentaram. Mas muitos que se dizem calvinistas hoje não conseguem manter esses dois conceitos juntamente e, mesmo dizendo que confessam a CFW, ignoram esse elemento tão claro nela.

O paradoxo não diz respeito apenas às doutrinas da soberania de Deus e da responsabilidade humana. Deus é um ser paradoxal e isso pode ser visto em toda a Bíblia. Ele é transcendente e imanente. Tem propósitos eternos e ação temporal. É justo e amoroso. Quase sempre a sustentação dessas virtudes, principalmente como elas são descritas na Bíblia, só poderia ser considerada contraditória pela mente enciclopédica iluminista. O próprio conceito mais equilibrado sobre a inspiração atesta que a Bíblia é palavra de Deus e palavra do homem. O que é isso senão um grande paradoxo? Jesus Cristo é totalmente Deus e totalmente homem. É o logos eterno que se encarnou. É o imortal que morreu na cruz. Esse é o supremo paradoxo da Bíblia. Nenhuma descrição poderia ser mais incompreensível para uma mente puramente racional do que essa. O homem descrito pela Bíblia também é um ser paradoxal. Ele é mortal, mas tem uma alma imortal. É bom, mas é mau, pois é feito à imagem de Deus (que ainda permanece depois da queda), mas é totalmente depravado em virtude do pecado.

O que se pretende dizer com isso é que o conceito de verdade sustentado pela Bíblia nada tem a ver com o conceito proposicional do iluminismo. O conceito de verdade apresentado pelo Novo Testamento é diferente do conceito racionalista de algo que pode ser testado objetivamente por ferramentas cartesianas ou aristotélicas. Verdade, conforme o Novo Testamento, “não é algo abstrato nem puramente objetivo; é pessoal” (McGrath, 2007, pág. 149). A verdade chama as pessoas para um relacionamento, para um pacto. Conhecer a verdade, portanto, é muito mais do que assentir intelectualmente para algo, ou chegar à conclusão de que aquilo passou nos testes de averiguação, e sim experimentar no interior uma certeza confirmada pelo Espírito Santo que faz sentido tanto para o intelecto quanto para o coração. Grenz diz: “Não devemos deixar de reconhecer a importância fundamental do discurso racional, porém, nossa compreensão da fé não deve se limitar à abordagem proposicional que nada mais vê na fé cristã a não ser a correção da doutrina ou a verdade doutrinária” (1997, pág. 246).

Os teólogos reformados que negam o paradoxo porque acham que ele não se encaixa com os padrões da lógica precisam lembrar que essa não é a única coisa no cristianismo e na Bíblia que não se encaixa. O que dizer da encarnação do Deus-homem, do nascimento virginal, da expiação substitutiva, da ressurreição dos mortos, etc. Essas coisas não podem ser medidas pelos padrões da lógica humana, são supra-racionais, pois estão muito além da razão humana. Porém, não são irracionais, pois são a pura e simples verdade.

E a pura e simples verdade da Escritura é que precisamos manter os conceitos da Soberania de Deus e da Liberdade Humana juntos, sem abrir mão de um ou de outro, mas crendo que, mesmo que não se encaixem em nossa mente humana e limitada, se encaixam na mente do Deus todo-poderoso e todo-sábio, que não tem conselheiros, nem jamais pediu conselho a ninguém, que tem um entendimento que não se pode medir ou esquadrinhar. Podemos resumir tudo isso dizendo que: O Deus soberano em sua soberania decidiu que o homem seria livre (ainda que limitadamente) e perfeitamente responsável por seus atos.

Abraço o paradoxo por que qualquer formato não explica a plenitude do ensino bíblico.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Os santos também sujam os pés.



Um dos mais fascinantes momentos bíblicos, ao meu ver, é o momento em que Cristo, durante a última ceia, lava os pés dos discípulos. Toda vez que tento imaginar essa cena, meus olhos marejam... é simplesmente linda!!! E quanta coisa nos ensina...

Ali estavam eles, os discípulos... haviam andado com o Mestre por alguns anos, contemplando face a face o verbo, Deus encarnado, sentindo o cheiro de Deus, vendo o “jeitão” de Deus, ouvindo sua voz...

Mas estava chegando a hora final, a cruz que era desde a eternidade se fazia urgente, palpável, vinha dos tempos eternos para rasgar a história e ver cravada nela o cordeiro imolado desde antes da fundação do mundo. O que era fora do tempo, estava prestes a invadir a cronologia humana e executar o plano, o único plano de Deus para a salvação... a CRUZ.

Jesus então cinge-se com uma toalha, tira a vestimenta de cima, enche uma bacia com água e passa a lavar os pés dos discípulos. Vergonha!! Humilhação!! Quem lavava os pés geralmente era um servo, alguém a mando de seu senhor, dono da festa, dono da casa. Inversão de valores, servos sendo servidos, o Senhor era quem os servia, o dono da festa é quem “paga o mico”... e Ele se humilhou...

Pedro, em seu impetuoso temperamento, seu jeitão tosco, dono do mar, pescador destemido, na arrogância infantil que lhe era peculiar nega essa possibilidade: “nunca me lavarás os pés”. Gesto aparentemente humilde, pois trazia em seu bojo o reconhecimento da autoridade do Mestre, foi duramente reprovado por aquele que trazia a bacia e a toalha nas mãos: “Se eu não te lavar os pés, não tens parte comigo (...) quem já se banhou não necessita de lavar senão os pés; quanto ao mais está todo limpo...”

Os santos também sujam seus pés no caminho!

Mesmo aqueles que tem seus pés firmes na rocha, que caminham naquele que é o Caminho, podem por muitas vezes sujar os pés.

O que mais me fascina em Jesus é sua total compreensão da humanidade e sua não-religiosidade. Jesus hoje seria, com certeza, confundido com o AntiCristo por alguns líderes da “religião cristã”, pois seu modo de agir, suas palavras e sua maneira de encarar as coisas difere muito da chamada “moral evangélica”.

Jesus não seria “evangélico”. Cada vez mais me convenço disso. Seu modo de lidar com os erros, com as dificuldades daqueles que sujam os pés no caminho é totalmente diferente da forma como vejo a “igreja”. Ele cuida, ele trata, ele lava os pés, mas não deixa de dizer que o corpo já está limpo... são só os pés... empoeirados, sujos, machucados... quão diferente daqueles que jogam fora a criança junto com a água da bacia... tão típico dos grandes coronéis-apóstolos-super-pastores de nossos “arraiais”.

Essa santidade que anda por aí, que não abre espaço aos pés sujos no caminho, essa eu não quero! Essa santidade do “não toque”, “não prove”, “não mexa” ... é a santidade dos fariseus. Paulo já dizia que essa santidade na verdade é falsa humildade, culto de si mesmo! (Cl 2.20-23). Essa santidade daqueles que querem ser mais santos do que Deus, daqueles que dizem que é pecado aquilo que Deus nunca chamou de tal, essa eu rejeito! A santidade dos “levitas”, dos “apóstolos”, dos “semi-deuses”, dessa eu quero distância.

Quero deixar claro que não estou fazendo uma apologia ao pecado! O mesmo Paulo que escreve o texto acima também diz que não devemos fazer uso dessa liberdade para dar ocasião à carne (Gl 5.13). Para a liberdade foi que Cristo nos chamou, principalmente porque nos libertou do império das trevas, da tirania da carne, para o reino do Filho do seu amor. Liberdade que nos faz responsáveis e que nos enche de gratidão pela graça (ah! a graça) que nos enche os pulmões e a alma do vento que sopra onde quer.

O que estou querendo dizer é que é possível, mesmo no Caminho, sujar os pés... e encontrar consolo naquele que lava pés, corações, mentes, olhos, simplesmente por ser a água viva.

Que Ele nos guarde de todo o mal no caminho que, às vezes, nos suja os pés.

Com carinho,

José Barbosa Junior

segunda-feira, 10 de maio de 2010

O velho homem é uma roupa

Por Leonardo Gonçalves

O velho homem é uma roupa. É uma roupa velha e encardida, rota pelo uso e que apesar de cobrir a vergonha, de tão velha e fora de moda, já não se pode usar [1]. Estar vestido do velho homem significa estar vestido desta roupa de justiça própria, revestido de uma religião piegas, que apesar de ter alguma aparência de santidade, não pode combater a carne [2], e está fadada ao fracasso.

Permanecer vestido de velho homem é estar ainda buscando subterfúgios que possam esconder a nossa vergonha e escândalo [3]. É ancorar-se no Sinai e fechar os olhos para a teofania do Monte Tabor. É ainda a rejeição voluntária e obstinada das vestes mais excelentes, fruto do sacrifício propiciado pelo próprio Deus [4].

Eu não quero essa roupa velha! Cansei desta túnica mosaica de milênios atrás. As folhas de figueira perecem, murcham com o tempo, e minha vergonha permanece lá. Portanto, já não encobrirei minhas transgressões, nem me esconderei em uma capa rota de justiça morta; pano imundo do qual se vestem os hipócritas dissimulando que tudo está bem. Reconheço-me tal como sou: Nascido em pecado, e a menos que haja um milagre em mim, eternamente pecador.

Vestir-se do novo homem é reconhecer-se ainda nu. Sem obras, sem dons e sem justiça. Aceito-me ridículo e errante, e clamo a Deus por perdão. E Ele, conforme sua Palavra Eterna que não pode mentir, me cobre de uma justiça verdadeira, e confere a mim – o maior dos pecadores – uma santidade posicional e perfeita [5].

O novo homem é uma nova criação. Ele descansou, mas não para sempre. Sim, “o pai trabalha até agora” [6], transformando pecadores em santos, e em escala industrial!

Nasci nu. Meus pais, a sociedade e a religião me ensinaram a cobrir minhas transgressões, dando sempre a aparência de ser perfeito e politicamente correto. Hoje, desnudo-me ante Ti com reverência e temor, mas com a confiança filial de que não deixarás meu corpo exposto ao relento. Tal como Adão no Éden, hei de ser coberto e protegido no teu sacrifício.

Obrigado, Senhor, por permitir-me acercar nu à tua presença, encontrando em ti a minha justificação. Jamais estive tão santo! Jamais me conheci tão pecador!

Oh, mistério da graça… Maior (bem maior!) que o meu pecar!

quinta-feira, 22 de abril de 2010

QUAL O POTENCIAL DA ORAÇÃO? - Leonard Ravenhill

Quem pode calcular as dimensões do poder de Deus? Os cientistas fazem estimativas do peso total do globo terrestre,
os estudiosos da Bíblia chegam a decifrar as medidas da Cidade Celestial, os astrônomos contam as estrelas no céu,
outros medem a velocidade do relâmpago e dizem precisamente quando o sol se levanta e se põe - no entanto, é
impossível estimar o poder da oração. A oração é tão vasta quanto o próprio Deus, porque é ele mesmo que está por trás
dela. A oração é tão poderosa quanto Deus, pois ele se comprometeu a respondê-la. Que Deus tenha compaixão de nós,
por sermos tão gagos e hesitantes nesta que é a atividade mais nobre da língua e do espírito do homem. Se Deus não
nos iluminar no nosso recinto privado de oração, andaremos em trevas. No tribunal de Cristo, o fato mais vergonhoso que
o cristão haverá de enfrentar será a pobreza da sua vida de oração. Leia este trecho majestoso do ilustre pregador do
quarto século, Crisóstomo: "O imenso poder da oração já sujeitou a força do fogo; amarrou a ira de leões, acalmou as
insurreições de anarquia, pôs fim a guerras, aplacou as forças selvagens da natureza, expeliu demônios, rompeu os grilhões
da morte, expandiu os limites do reino dos céus, aliviou enfermidades, afastou fraudes, resgatou cidadãos da destruição,
parou o sol no seu curso, e impediu o avanço do raio destruidor. "A oração é uma panóplia (armadura) contra todo mal, um
tesouro que nunca se diminui, uma mina que jamais poderá ser esgotada, um céu sem qualquer obstrução de nuvem,
um horizonte imperturbado por tempestades. É a raiz, a fonte, a mãe, de incontáveis bênçãos." Estas palavras são mera
retórica, tentando dar uma aparência superlativa a algo comum? A Bíblia não conhece tais engenhosidades humanas.
Oh, Por um Elias! Elias era um homem experimentado na arte da oração, que alterou o curso da natureza, estrangulou a
economia de uma nação, orou e o fogo caiu, orou e o povo caiu, orou e a chuva caiu. Precisamos hoje de chuva, chuva e
mais chuva! As igrejas estão tão ressecadas que a semente não pode germinar. Nossos altares estão secos, sem
lágrimas quentes de suplicantes penitentes. Oh, por um Elias! Quando Israel clamou por água, um homem feriu a
rocha e aquela enorme fortaleza de pedra se transformou numa madre, que deu à luz uma fonte de águas a dar vida.
"Acaso para Deus há coisa demasiadamente difícil?" (Gn 18.14). Que Deus nos envie alguém que possa ferir aquela
rocha! De uma coisa estejamos certos: O recinto de oração não é lugar para simplesmente entregar ao Senhor uma lista
de pedidos urgentes. A oração pode mudar as coisas? Certamente, mas, acima de tudo, a oração muda os homens. A
oração não só tirou a desonra de Ana, mas a mudou - transformou-a de mulher estéril em frutífera, de pessoa tristonha em
alguém cheio de gozo (1 Sm 1.10 e 2.1); de fato, converteu o seu "pranto em dança" (Sl 30.11). Quem sabe, estamos
orando para dançar quando ainda não aprendemos a lamentar! Estamos buscando uma veste de louvor, quando Deus
disse: "... e dar a todos os que choram ... veste de louvor em vez de espírito angustiado" (Is 61.3, NVI). Se quisermos
colher, a mesma ordem é dada: "Quem sai andando e chorando enquanto semeia, voltará com júbilo, trazendo os
seus feixes" (Sl 126.6). Foi preciso um homem de coração partido, que lamentava profundamente, como Moisés, para
poder dizer: Ó Deus, este "povo cometeu grande pecado... Agora, pois, perdoa-lhe o pecado; ou, se não, risca-me, peço-te,
do livro que escreveste" (Êx 32.31,32). Somente um homem que sentisse uma profunda carga de dor, como Paulo,
poderia dizer: "... tenho grande tristeza e incessante dor no coração; porque eu mesmo desejaria ser anátema, separado
de Cristo, por amor de meus irmãos, meus compatriotas, segundo a carne" (Rm 9.2,3). Se John Knox tivesse orado:
"Dá-me sucesso!", nunca mais teríamos ouvido falar dele. Porém, ele fez uma oração expurgada de desejos pessoais:
"Dá-me a Escócia, senão eu morro!", e assim marcou as páginas da história. Se David Livingstone tivesse orado para
conseguir abrir o continente africano, como prova de seu espírito indomável e habilidade com o sextante, sua oração teria
morrido com o vento da floresta; porém, sua oração foi: "Senhor, quando será curada a ferida do pecado deste mundo?"
Livingstone vivia em oração e, literalmente, morreu de joelhos, em oração. A solução para este mundo tão insaciável por
pecado é uma igreja insaciável por oração. Precisamos explorar novamente as "preciosas e mui grandes promessas" de
Deus (2 Pe 1.4). Naquele grande dia, o fogo do juízo haverá de provar o tipo, e não a quantidade, da obra que fizemos.
Aquilo que nasceu em oração passará pela prova. Na oração, tratamos com Deus e coisas acontecem. Na oração, fome de
ganhar almas é gerada; quando há fome para ganhar almas, mais oração é gerada. O coração que tem entendimento
ora; o coração que ora adquire entendimento. O coração que ora, reconhecendo sua própria fraqueza, recebe força
sobrenatural do Senhor. Oh, que fôssemos pessoas de oração, tal qual Elias - que era um homem sujeito aos mesmos
sentimentos que nós! Senhor, ajuda-nos a orar! Extraído de um livro escrito por Leonard Ravenhill em 1959, Why Revival
Tarries (Por que o Avivamento Demora).

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Entretenimento - Estratégia do Mal



Sei que o entretenimento está tão enraizado na cultura evangélica, que parecerá um absurdo a tese que defendo. Mas, além de não estar sozinho na luta contra o "culto show", estou ainda muito bem acompanhado, por pastores renomados, como Charles Haddon Spurgeon, que no século XIX já havia escrito sobre este perigo, alertando que o fermento diabólico do entretenimento acabaria levedando toda a massa em curto espaço de tempo. E é neste estado de lastimável fermentação que se encontra a massa evangélica atual.

Hoje em dia é quase impossível que uma igreja não tenha conjuntos musicais, ou corais, ou grupos de coreografia, ou cantores para se apresentar durante o culto e nos eventos por ela realizados. Na maioria das igrejas o período de culto é tomado deste tipo de apresentações, com a desculpa de que "é pra Jesus". Mas, quando analisamos racionalmente, e a luz das Escrituras, a verdade é que tais apresentações não passam de entretenimento, com verniz de santidade e capa de religiosidade.

Que ninguém fique ofendido. Eu mesmo gostaria que alguém houvesse me alertado disso na época em que eu, cegamente, gastava horas com ensaios de conjuntos e de peças teatrais. E eu me convencia de que isto era a obra de Deus.

Mas, no fundo de meu coração, eu sabia que havia algo de errado, que não era nisto que Jesus esperava que seus discípulos se focassem, ou se esforçassem. Como ninguém me despertou, busquei a Deus em oração e o próprio Espírito Santo, por meio das Escrituras, convenceu-me do meu erro.

Desde então, tenho meditado tão seriamente a respeito disto, que encontrei mais de dez razões para eliminar por completo o entretenimento dos cultos na igreja que pastoreio. E já o fizemos! Substituimos o tempo que antes gastávamos com ensaios entre quatro paredes, pelo evangelismo bíblico na comunidade e pela oração nos lares. E, quanto às apresentações nos cultos... sinceramente, não estão fazendo a menor falta.

Mas, vejamos porque o entretenimento deve ser eliminado dos cultos que realizamos ao Senhor:


1 - O Senhor nunca ordenou entreter as pessoas

Esta já seria uma razão suficiente, que dispensaria os demais argumentos. O problema é que raramente se encontra hoje uma igreja que queira ser bíblica, composta por membros que só desejem cumprir a vontade de Deus, expressa em sua Palavra. Assim sendo, talvez seja necessário ainda os argumentos a seguir.


2 - Entretenimento não atrai ovelhas

Chamemos de ovelhas aqueles que realmente amam a Jesus, que reconhecem a voz do Senhor e o seguem (Jo 10:27). No entanto, a divulgação de apresentações na igreja dificilmente atrairá pessoas interessadas em Deus. Certamente será um atrativo para as que gostam de uma distração gratuita. Mas, podemos chamar a estas pessoas de ovelhas, ou não há uma grande chance de serem bodes? (Mt 25:32-33)


3 - Entretenimento afasta as ovelhas

As verdadeiras ovelhas não se satisfazem com apresentações durante o culto. Elas querem oração e palavra, edificação e unção. Uma ovelha de Cristo não procura emoções, mas a Verdade, para que se mantenha firme no caminho da vida eterna (Jo 6:67). Quanto mais o pastor encher o culto com apresentações, mais rápido as ovelhas sairão em busca de uma verdadeira igreja, que priorize a oração e a palavra de Deus. Aos poucos, a "igreja-teatro" deixará de ter ovelhas para estar ainda mais cheia, porém de bodes, que gostam de uma boa distração. E, infelizmente, o que muitos pastores buscam hoje é quantidade, o crescimento a qualquer custo. E, com este fermento, a massa realmente cresce...


4 - Entretenimento reduz o tempo de oração e palavra

O tempo de culto já é muito limitado, chegando a no máximo duas horas. Quando se dá oportunidade para apresentações, o tempo que deveria ser usado para se fazer orações e se pregar a palavra de Deus torna-se curtíssimo. Em algumas igrejas não chega nem a trinta minutos! Como desenvover uma mensagem expositiva em tão curto espaço de tempo?

5 - Entretenimento confunde os visitantes

Os visitantes concluem que a igreja existe em função disto: conjuntos, corais, coreografias, peças teatrais, ou qualquer outro tipo de apresentação que torne o culto um show. E eles passam a frequentar os cultos com esta expectativa, esperando pelo próximo espetáculo.

6 - Entretenimento ilude os membros

O membro pensam que está servindo a Deus com suas apresentações. Desta forma, sua consciência fica cauterizada para atender aos chamados para a escola bíblica, para o evangelismo e para socorrer os carentes. Afinal de contas, ele pensa que seu chamado é para as artes, e não para serviços que não lhe colocam debaixo dos holofotes (que, aliás, são muito comuns nas igrejas hoje em dia).

7 - Entretenimento é um desgaste desnecessário

Quanto esforço é despendido para que tudo saia perfeito! Uma energia que é gasta naquilo que o Senhor nunca mandou fazer! Será que ainda sobram forças para se fazer o que realmente o Senhor manda? (Lc 6:46)

8 - Entretenimento coloca os carnais em destaque

Pessoas que raramente aparecem nos cultos de oração e estudo bíblico, e que nunca comparecem ao evangelismo, geralmente são as mesmas que gostam de aparecer cantando, dançando ou representando nos cultos mais cheios. A questão é: Por que dar destaque justamente para estes membros carnais?

9 - Entretenimento promove disputas

Disputas entre membros, entre conjuntos e até entre igrejas. Quem canta melhor? Quem dança melhor? Que conjunto tem o uniforme mais bonito? Quem recebeu mais oportunidade? Quanta medíocre carnalidade... (1 Co 3:3; Tg 4:1)


10 - Entretenimento alimenta o ego

O entretenimento não gera fé, mas fortalece o ego dos que amam os aplausos e elogios. Apesar de sua roupagem "gospel", o fermento dos fariseus continua tão venenoso quanto nos dias de Jesus (Mt 23:5-6; Lc 12:1)

11 - Entretenimento é um desperdício de tempo

Se o mesmo tempo que as igrejas gastam com ensaios e apresentações fosse utilizado com oração e evangelismo, este mundo já teria sido alcançado para o Senhor! (Ef 5:15-17)

12 - Entretenimento não é fazer a obra de Deus

A desculpa para o entretenimento é que este seria uma forma de atrair as pessoas. Mas a questão novamente é: que tipo de pessoas? Se entretenimento fosse uma boa alternativa, não teria a igreja apostólica usado de entretenimento para atrair as multidões? No entanto, ela simplesmente pregava o evangelho, porque sabia que nele há poder. O evangelho "é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê" (Rm 1:16). Mas o entretenimento... O entretenimento é a artimanha do homem para a perdição de todo aquele que duvida.

Quero concluir com uma palavra aos pastores. De pastor, para pastor. Amado colega de ministério, não duvide do poder do evangelho para atrair e converter as pessoas. Não queira encher sua igreja com atividades vazias e atraentes ao mundo, mas que não tem o poder do Espírito Santo para converter vidas. Tenha coragem e limpe sua congregação desta imundície egocêntrica. Talvez com isto você perderá alguns membros, mas não perderá ovelhas, somente bodes. Tenha fé em Deus e confie no modelo bíblico para encher a igreja, que é a oração, o bom testemunho e a pregação ousada do genuíno evangelho de Cristo. Lembre-se que "enquanto os homens procuram melhores métodos, Deus procura melhores homens."




Blog do Alan Crapriles

terça-feira, 13 de abril de 2010

Temor

O temor de Deus é uma graça precursora: é a primeira semente que Deus planta no coração. Embora o crente não saiba quase nada da fé e, talvez, nada da segurança da salvação, ele não se atreve a negar, mas teme a Deus. Deus é tão grande que ele teme ofendê-lo e tão bom que teme perdê-lo. "Tu, porém, teme a Deus" [Ec 5.7].

O temor que o cristão sente não é servil, mas filial. Há uma grande diferença entre temer a Deus e ter medo de Deus. O piedoso teme a Deus, assim como um filho dedicado e amoroso teme ao pai; mas os ímpios têm medo de Deus, como o prisioneiro, do seu juiz.

Temor e amor seguem melhor quando combinados. O amor é a vela que impulsiona o mover da alma; o temor é o lastro que a estabiliza na religião.

O temor de Deus combina-se com a fé: "Pela fé, Noé... temeu" [Hb 11.7, ARC]. A fé mantém o coração alegre, conserva-o sereno, livra-o do desespero, guarda-o da presunção.

O temor de Deus combina-se com a prudência. Quem teme a Deus tem olhos de serpente e mentalidade de pomba, antevendo e evitando as rochas sobre as quais os outros se espedaçam. O temor de Deus não torna o crente covarde, mas o faz cauteloso. "O prudente vê o mal e esconde-se" [Pv 22.3].

O temor de Deus é a segurança do crente; nada pode feri-lo verdadeiramente. Roubem-lhe o dinheiro; ele leva consigo um tesouro do qual não pode ser espoliado. "O temor do SENHOR será o teu tesouro" [Is 33.6]. Prendam-no com grilhões; mas ele é livre. Matem seu corpo; ele ressuscitará. Aquele que usa o peitoral do temor de Deus, pode ser atingido, mas não traspassado.

O temor de Deus combina-se com a esperança. "Os olhos do SENHOR estão sobre os que o temem, sobre os que esperam na sua misericórdia" [Sl 33.18]. O temor está para a esperança, assim como o azeite está para a lâmpada: ele a mantém acesa. Quanto mais tememos a justiça de Deus, mais esperança temos na sua misericórdia.

A fé está de sentinela na alma, sempre na torre de vigia: o temor causa prudência. Quem anda em temor, caminha com cautela. A fé induz à oração e a oração suscita o socorro do céu.

O temor do Senhor é um grande purificador: "O temor do SENHOR é límpido" [Sl 19.9]. É inerentemente puro e de ação eficaz. O coração é o "santuário de Deus", e o temor santo varre e purifica esse templo para que não seja profanado.

O temor de Deus desperta o júbilo espiritual: estrela da manhã que prenuncia a luz solar da consolação. Caminhando-se no temor do Senhor e na consolação do Espírito Santo, Deus mistura alegria e temor, para que o temor não seja tirânico.

O temor de Deus é um antídoto contra a apostasia: "porei o meu temor no seu coração, para que nunca se apartem de mim" [Jr 32.40]: Amá-los-ei tanto que não me apartarei deles; temer-me-ão de tal modo que não se apartarão de mim.

O temor de Deus induz à obediência. Lutero disse: "prefiro obedecer a Deus a operar milagres". Tratando cruelmente um cristão, certo pagão perguntou-lhe com escárnio que grande milagre já fizera o seu Mestre, Jesus Cristo. O cristão respondeu-lhe: "Este: o de eu poder lhe perdoar, apesar de você me tratar assim".

O temor de Deus adoça a porção escassa: "Melhor é o pouco, havendo o temor do SENHOR" [Pv 15.16], porque é adoçado com o amor de Deus e é garantia de mais: o pouco de azeite na botija é o penhor da alegria e da bem-aventurança que a alma desfrutará no céu. As migalhas caídas que couberam a Lázaro eram mais doces do que o banquete ao homem rico. Um punhado de comida, com a bênção de Deus, é melhor do que todas as riquezas não santificadas.

Amor sincero e santo temor andam de mãos dadas; o temor procede do amor para que o favor de Deus não se perca por causa do pecado.


Publicado em Mens Reformata
Fonte: "Fear of God", Puritan Gems (1850; pp. 51-11)
Autor: Thomas Watson (c. 1620—1686)

Tradutor: Marcos Vasconcelos